A colheita do café manual ou mecanizada é realizada anualmente visando à retirada de toda a produção obtida na safra. Geralmente ela é procedida no meio do ano nos meses de maio a agosto sendo realizada na planta e também no chão em duas operações: colheita do café de planta e recolhimento do café de chão (MATIELLO et al. 2010).
Na colheita do café da planta para desprender os frutos dos ramos ocorre grande exposição das partes vegetativas aos órgãos derriçadores (mãos trabalhadores ou hastes da derriçadoras das colhedoras) promovendo danos ao cafeeiro. Os danos são desfolha quebra de ramos laterais e também o ramo principal em alguns casos notadamente na “ponteira” descortiçamento do tronco e danificação das gemas e botões florais ocorrendo esta última principalmente quando a colheita é executada tardiamente (SANTINATO et al. 2013). Independentemente do tipo de dano este refletirá em alterações na morfologia da planta e em alguns casos culminará na redução da produtividade (SANTINATO et al. 2014).
A produtividade do cafeeiro está condicionada ao crescimento ocorrido no ano anterior (CAMARGO & CAMARGO 2001). Sendo assim quanto maior o número de ramos e número de nós crescidos no período maior será a capacidade produtiva da planta. Outros fatores tais como o comprimento e espessura do internódio também interferem na capacidade produtiva da lavoura (SANTINATO et al. 2014b).
Além destes fatores em que a ação do homem pode influenciar alterando o manejo da cultura (adubação fitosanidade práticas culturais e sistema de colheita) existem também os fatores edafoclimáticos como temperatura pluviosidade de umidade relativa do ar que irão configurar a floração pegamento da florada e o enchimento de grão. Cerca de apenas 50% das flores emitidas tornam-se frutos e os frutos permanecem nos pés durante aproximadamente 220 dias estando sujeitos a vários fatores que podem reduzir a produtividade (MATIELLO et al. 2010).
Devido à dificuldade de se obter produtividades elevadas objetiva-se com este capítulo apresentar resultados de três experimentos que evidenciam o reflexo de várias práticas utilizadas na colheita do café na morfologia e na produtividade das plantas apontando possíveis recomendações e soluções para o cafeicultor na tentativa de minimizar as perdas na safra seguinte.
Experimento 1
Neste primeiro experimento apresentado estudou-se a colheita mecanizada do café com uma a seis operações da máquina comparando-a à colheita manual em lavouras de produtividade elevada e mediana (respectivamente 12154 e 5078 sacas de café ben.ha-1).
Este trabalho foi instalado em 2013 no município de Patos de Minas MG nas Fazendas Dona Neném e São João Grande de propriedade de Eduardo Pinheiro Campos em lavouras da cultivar Catuaí Vermelho IAC 144. Utilizou-se uma colhedora Jacto modelo K3 que operou em todos os tratamentos com 800 rpm e 1.000 m h-1. Os sete tratamentos foram delineados em blocos ao acaso com quatro repetições em parcelas de cinco plantas em cada uma das áreas. Avaliou-se a biometria das plantas ao longo do tempo a configuração dos ramos plagiotrópicos e as produtividades durante duas safras posteriores à execução dos tratamentos.
Na lavoura de carga inicial alta (12154 sacas de café ben.ha-1) a colheita mecanizada com uma operação da colhedora proporcionou menores danos causados às plantas (dado pela quantidade de material vegetal perdido incluindo folhas ramos e flores) em relação aos demais tratamentos sendo 419% inferior à colheita manual. A colheita com duas operações da colhedora promoveu danos causados às plantas semelhantes à colheita manual. A partir de três operações a colheita mecanizada danificou mais os cafeeiros que a colheita manual com superioridade que variou de 311 a 494%. As colheitas com cinco e seis operações apresentaram a mesma quantidade de danos causados às plantas entre si (Tabela 1). Da mesma forma na lavoura de carga inicial intermediária (5078 sacas de café ben.ha-1) a colheita com uma operação da colhedora foi o tratamento menos prejudicial às estruturas vegetativas das plantas com 3096% a menos de danos causados às plantas que a colheita manual. A colheita com duas operações acarretou na mesma quantidade de danos causados às plantas que a colheita manual. Com três operações da colhedora houve acréscimo de 2836% nos danos causados às plantas em relação a colheita manual. As colheitas com cinco e seis operações acarretaram em valores semelhantes em torno de 50% superiores à colheita manual (Tabela 1).
Tabela 1. Danos causados às plantas decorrentes das colheitas mecanizadas com uma a seis operações da colhedora e colheita manual em duas lavouras de café Patos de Minas MG.
Número de operações da colhedora | Lavoura de carga inicial alta | Lavoura de carga inicial intermediária |
Danos causados às plantas | ||
(kg planta-1) | ||
1 | 057 Aa | 068 Aa |
2 | 115 Ab | 102 Ab |
3 | 143 Ac | 137 Ac |
4 | 165 Ad | 167 Ad |
5 | 182 Ade | 194 Ae |
6 | 194 Ae | 216 Ae |
Colheita manual | 098 Ab | 098 Ab |
CV (%) | 737 | 642 |
*Médias seguidas por mesmas letras minúsculas comparadas nas colunas não diferem entre si pelo teste de Tukey à 5% de probabilidade. Médias seguidas por mesmas letras maiúsculas comparadas nas linhas não diferem entre si pelo teste t à 5% de probabilidade.
A lavoura de carga inicial alta (12154 sacas de café ben.ha-1 na safra 2013) produziu na safra de 2014 em torno de 4414 sacas de café ben.ha-1 representando redução de 6368%. A lavoura de carga inicial intermediária (5078 sacas de café ben.ha-1 na safra 2013) produziu na safra de 2014 9562 sacas de café ben.ha-1 (Tabela 2) obtendo acréscimo de 4682%. Tal fato demonstra o efeito acentuado da bienalidade do cafeeiro que ocorre devido a competição de metabólitos que são utilizados para o crescimento das plantas e produção de frutos. Normalmente a bienalidade é mais acentuada negativamente na safra seguinte a uma safra de elevada produtividade uma vez que o cafeeiro não regula a carga que irá produzir (RENA et al. 1986). A produção elevada consiste em um dreno muito intenso de nutrientes dessa forma a planta desenvolve baixo crescimento de nós e ramos novos e como consequência apresentará baixa produtividade na safra seguinte (DaMATTA et al. 2004). Na média do biênio obteve-se carga de 8284 e 732 sacas de café ben.ha-1 respectivamente para as lavouras de carga inicial alta e intermediária.
Na lavoura de carga inicial intermediária as maiores produtividades na safra de 2014 foram obtidas nos tratamentos com uma e duas operações da colhedora bem como a colheita manual. Tais produtividades foram cerca de 64% inferiores à primeira safra (Tabela 2).
A colheita com três operações promoveu redução de 2174% na produtividade em relação à colheita manual o que corresponde a 942 sacas de café ben.ha-1 a menos. As colheitas com quatro a seis operações acarretaram em produtividades 6672 a 8668 inferiores à colheita manual correspondendo à redução de produtividade de 11576 sacas de café ben.ha-1 em relação à safra do ano anterior (12154 sacas de café ben.ha-1) (Tabela 2). Tamanha redução é atribuída ao efeito da bienalidade também constatada por Pereira et al. (2011) e Valadares et al. (2013) demonstrando os efeitos negativos decorrentes dos tipos de colheita na produção.
Devido ao ano de bienalidade positiva em 2014 na lavoura de carga inicial intermediária houve incremento na produtividade em relação à safra anterior em todos os tratamentos exceto aonde utilizou-se a colheita com cinco operações da colhedora que obteve valores semelhantes à colheita com seis operações (Tabela 2). As colheitas com cinco e seis operações reduziram a produtividade de maneira acentuada.
As maiores produtividades foram obtidas nas colheitas com uma e duas operações da colhedora e colheita manual com acréscimo médio de 8384% em relação à safra anterior (Tabela 2). As colheitas com três e quatro operações acarretaram reduções de produtividade de 1674 e 2265% em relação à colheita manual.
Tabela 2. Produtividade da 2ª safra e variação de produtividade em relação à 1ª safra decorrentes das colheitas mecanizadas com uma a seis operações da colhedora e colheita manual realizadas na 1ª safra em duas lavouras de café Patos de Minas MG.
Número de operações da colhedora | Lavoura de carga inicial alta | Lavoura de carga inicial intermediária | ||
Produtividade 2ª safra Sacas de café ben ha-1 | Variação de produtividade % | Produtividade 2ª safra Sacas de café ben ha-1 | Variação de produtividade % | |
1 | 4414 Aa | - 6368 | 9562 Ba | + 883 |
2 | 4327 Aa | - 6439 | 9321 Ba | + 8356 |
3 | 3391 Ab | - 7491 | 7595 Bb | + 4958 |
4 | 1442 Ac | - 8813 | 7056 Bb | + 3896 |
5 | 978 Ac | - 9195 | 4583 Bc | - 975 |
6 | 577 Ac | - 9524 | 5144 Bc | + 131 |
Colheita manual | 4333 Aa | - 6435 | 9123 Ba | + 7967 |
CV (%) | 2589 | - | 2069 | - |
*Médias seguidas por mesmas letras minúsculas comparadas nas colunas não diferem entre si pelo teste de Tukey à 5% de probabilidade. Médias seguidas por mesmas letras maiúsculas comparadas nas linhas não diferem entre si pelo teste t à 5% de probabilidade.
Notou-se que na lavoura de carga inicial alta logo após a colheita o enfolhamento foi menor onde se utilizaram repetidas operações da colhedora obtendo valores de 2179 e 466% respectivamente para seis e três operações da colhedora. Isso ocorreu devido à maior desfolha proporcionada pela repetição de operações o que aumenta o tempo de contato das varetas da colhedora com a vegetação da planta. A colheita com uma passada proporcionou enfolhamento semelhante à colheita manual (Figura 3).
Após 90 e 180 dias verifica-se que a diferença de enfolhamento entre os tratamentos diminuiu consideravelmente de forma que os valores ficaram próximos. Segundo as equações de regressão os valores tendem a se estabilizar ao longo dos dias que transcorrem (Tabela 3). Analisando o coeficiente angular da reta verifica-se que a taxa de enfolhamento foi superior nos tratamentos que obtiveram os menores valores iniciais de enfolhamento notadamente no que utilizou seis operações da colhedora. Isso ocorreu devido ao efeito do “palmeamento” que se dá pela emissão constante de ramos plagiotrópicos secundários e consequentemente maior número de nós e de folhas (MATIELLO et al. 2010).
Na última avaliação realizada (270 dias após a colheita) nota-se que o enfolhamento foi semelhante em todos os tratamentos fato este que demonstra a elevada capacidade do cafeeiro de recomposição de seus ramos e da área foliar. Nos novos nós haverá gemas que se diferenciarão em folhas e também em frutos que pertencerão à safra de dois ciclos seguintes uma vez que geralmente no momento da colheita a safra subsequente já encontra-se definida pelo crescimento no ano anterior. Isto sugere que na próxima safra (2015) a capacidade produtiva das plantas poderá ser semelhante entre os tratamentos independentemente do tipo de colheita realizado.
Na lavoura de carga inicial intermediária as plantas estavam mais enfolhadas que na lavoura de carga inicial alta com valores superiores à 55% mesmo quando utilizou-se seis operações da colhedora (Figura 4). Essa diferença é referente à carga que a lavoura de carga inicial alta apresentava antes de ser colhida (12154 sacas de café ben.ha-1) sendo maior que o dobro da carga da lavoura de carga inicial intermediária. Em lavouras de alta produtividade ocorre naturalmente maior senescência das folhas devido ao esgotamento das reservas que foram drenadas para os frutos (MATIELLO et al. 2010). No entanto os valores finais de enfolhamento entre as duas lavouras foram semelhantes entorno de 90%. Segundo DaMatta et al. (2007) o período citado correspondente ao mês de abril é quando ocorre o máximo ganho de área foliar em cada ciclo do cafeeiro tendendo a se estabilizar e posteriormente se reduzir após a colheita.
Figura 3. Enfolhamento proporcionado por diferentes tipos de colheita ao longo de 270 dias na lavoura de carga inicial alta safras 2013/14 Patos de Minas MG.
Figura 4. Enfolhamento proporcionado por diferentes tipos de colheita ao longo de 270 dias na lavoura de carga inicial intermediária safras 2013/14 Patos de Minas MG. |
Tabela 3. Enfolhamento do cafeeiro nas lavouras de carga inicial alta e intermediária em função do número de operações da colhedora e colheita manual Patos de Minas MG.
*Médias seguidas por mesmas letras maiúsculas comparadas nas colunas superiores de coloração cinza e minúsculas comparadas nas colunas intermediária de coloração preta e na linha pontilhada não diferem entre si pelo teste de Tukey à 5% de probabilidade.
A análise de variância apontou diferença nos tratamentos estudados quanto ao número de nós totais nós de crescimento e nós de produção apenas na lavoura de carga inicial alta sem haver diferença para a lavoura de carga inicial intermediária. Também não houve diferença pelo teste F (P ≤ 005) na lavoura de carga inicial alta para a variável nós velhos. Aos 270 dias após a colheita verifica-se que o maior número de nós foram obtidos nas colheitas com cinco e seis operações (Figura 5). Tal fato é decorrente do maior “palmeamento” dos ramos também verificado pela taxa de enfolhamento. Não verificou-se diferença nessa avaliação na lavoura de carga inicial intermediária provavelmente devido ao menor “palmeamento” decorrente do maior enfolhamento logo após a colheita. Isto por que quanto menor o enfolhamento maior é a penetração de luz solar no interior do dossel da planta que diferencia as gemas em ramos plagiotrópicos secundários (MATIELLO et al. 2010).
As colheitas com cinco e seis operações da colhedora obtiveram os menores números de nós de produção com menor presença de frutos nos ramos (Figura 5). Os resultados dessa avaliação foram confirmados pelas menores produtividades obtidas em 2014. O oposto é verificado com relação ao número de nós de crescimento o que poderá acarretar em produtividades maiores na safra de 2015 minimizando o efeito negativo da bienalidade na média das três safras. Não houve diferença entre os tratamentos quanto ao número de nós velhos.